- Sophia Eugênia Vieira
- 16 de mar. de 2024

Vou contar aqui sobre um filme que encontrei por acaso no Prime e adorei!
Three Thousand Years of longing ou Era uma vez um gênio conta a história de um gênio preso na lâmpada por 3 mil anos e de Aletheia (nome de origem grega cujo significado remete à busca pela verdade). Aletheia é uma mulher “apropriadamente feliz” e “sozinha por escolha”. Independente, vive do exercício da sua mente acadêmica; historiadora, pesquisa as “verdades comuns a todas as histórias da humanidade”. No filme, este cenário é narrado de entrada enquanto a personagem agita inquieta as pernas num claro sinal de ansiedade. Apropriadamente feliz.
Sempre que assisto a um filme, me esforço para captar as primeiras mensagens, imagens, todo tipo de detalhe nas primeiríssimas cenas. Elas quase sempre farão algum sentido no final.
A história é narrada através de um conto de fadas contemporâneo, quando a humanidade, tendo desenvolvido tantas avançadas tecnologias e engenharias que exploram o céu, as profundezas marinhas e impensáveis formas de captar e transmitir informações à distância, segue envolvida nos mais primitivos conflitos do desejo.
Me fez lembrar de uma conversa estranha e engraçada que tive com uma amiga que me perguntou certa vez: “mas como você pode ser tão freudiana e tão reprimida? era pra você ser mais livre!”. E a minha resposta teria sido algo como: exatamente, quero seguir livre e manter meu réu primário!
Às vezes, têm-se a ideia de que quem faz análise sai por aí pondo em prática tudo que pode ter sido represado ao longo da vida. Sim, muita coisa é colocada em marcha, a vida acontece, nós acontecemos. Mas sem perder o contato com a realidade. Aliás, em alguns casos, esse se torna o principal ganho: adquirir coragem para caminhar descalço sobre o chão da realidade (de dentro e de fora).
Bem, voltando ao filme, o conto se repete: o gênio somente será realmente livre se realizar três desejos daquela que o libertou da garrafa. Mas não desejos imediatos, eles terão de ser desejos desejados com o coração, com profundidade. No entanto, na medida em que o gênio narra suas tentativas anteriores de sair da garrafa e ser liberto, apresenta realizações de desejo desastrosas com consequências incontroláveis, o que aterroriza Aletheia.
Em vários momentos, a história me fez pensar que há desejos que não são para serem realizados. Ou que talvez a melhor forma de “realizá-los”, no sentido de torná-los reais, seria conhecê-los, mas não os satisfazer. Seria apropriar-se deles e assumir o controle de não os atuar.
Há desejos perigosos e há conflitos indissolúveis. “Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará!”. Para Wilfred Bion, um psicanalista, a busca pela verdade é o alimento da mente. Contudo, na busca pelo autoconhecimento, é provável que não encontremos uma essência muito, digamos, sublime. Acredito que o que mais se aproxima de um “verdadeiro eu” seja o resultado desses constantes acordos internos dos quais, quanto mais nos aproximamos, mais fortes e tolerantes nos tornamos, e mais conscientemente faremos escolhas.
Quando o desejo de Aletheia passou a ser a presença do gênio, não satisfazer seu último pedido tornou seu desejo realizável. E, assim, o gênio, desejoso de poder conversar - afinal de contas foram 3 mil anos de isolamento- e Aletheia puderam unir suas solidões e seguir desejantes.